O Teimoso Mascarello

Meu pai sempre me dizia que, não adiantava reclamar ou ficar olhando sem parar, o churrasco demora para ficar pronto. Por causa dessa demora, dizia meu pai, é que Deus inventou a Castanha de Caju. The lord work in mysterious ways, mas ponto pro papai do céu, eu pensava.

As pessoas teimam em dizer que o tempo passa rápido, até voa, agora diga isso para o pequeno Marcolino, todo encastanhado, olhando a picanha chorar no fogo... a pressa é minha velha amiga, e a perfeição é aquele medalhão de picanha suculento ali no espeto.

E quando finalmente chegava a hora de comer, eu a postos com meu garfinho, minha faquinha, defronte ao meu copo do Jaspion cheio de Guaraná Polar, descia do espeto aquele magnífico, suculento, tenro, saboroso pedaço de..... salsichão.... Cadê a picanha????? Cadê o pedacinho do céu???? Com o canto do olho eu a via e também meu pai rindo de mim, fazendo charminho de perna cruzada, se deliciando com meu sofrimento.

Eu suplicava, a mesa toda pedia para o patriarca-churrasqueiro que atendesse ao meu apelo por uma fatia do paraíso... e ele, retilíneo, gentilmente declinava, e com um ar de quem sabia das coisas; dizia:

- Tudo tem seu tempo, a picanha precisa ser cuidada, a labareda gentil precisa ir aquecendo devagarinho as membranas da carne para que ela fique como merece ficar.

Enfatizava ele, a parte do “MERECE”, eu ficava com a impressão que para ele aquilo era uma arte, não apenas preparar um prato, mas sim, dar àquela matéria-prima o destino que a ela deveria ser dado, o direito de atingir seu potencial, de ser o mais espetacular dos alimentos... Eu não....Eu queria matar minha fome...

Eu tinha pressa e ele tinha prática... prática, ou experiência, como queiram, se adquire com o tempo, devagar como a chama que ao longe queima a carne.

Poucos sabiam disso no Piemonte, ou ainda pior, sabiam mas ignoraram que há certas coisas de que só o tempo é capaz.

O Barolo é um vinho que, para atingir todo o seu potencial, é preciso esperar em torno de 25 anos, um lento processo de amadurecimento e evolução. E os apressados piemonteses, sempre eles, inventaram técnicas e trouxeram equipamentos para acelerar o processo e, por conseqüência, tirar desse vinho o seu fundamental descanso.

Todos menos um italiano, tido como teimoso, retrógrado por alguns, mas fundamentalmente, experiente, o senhor Bartolo Mascarello se negou a praticar essas novas técnicas de preparação. Técnicas essas que iam de encontro a todas as lições que ele havia aprendido na vida, e em especial uma, que seu vinho levava tempo para ficar pronto, muito tempo para que atingisse a condição de Barolo em sua melhor forma. Assim, manteve-se fiel ao antigo modo preparo, a despeito do “progresso” que chegava à Cantina ao lado, no entanto, mais uma vez, a prática venceu.



Hoje em dia, os vinhos Barolo de Bartolo Mascarello são tidos como ícones da indústria vinícola por conta da perseverança em manter a tradição na busca da qualidade acima de tudo, preservando esse “eno-ícone” da nossa pressa. Um brinde ao teimoso Mascarello.

4 comentários:

Leonardo disse...

Mais um ótimo post deixado por esse meu enofriend mais querido dos fiosyahoo!! Tem alguma garrafa desse Mascarello para degustar?? eheheh

Lela disse...

Eu conheço outro Mascarello teimoso !!!!! hahahaahhaahaha

Marco Mascarello disse...

Leo,

Que bom que tu gostou... Já tive, mas ela já foi... Se arrumar outra, vamos tomar juntos.

Lela,

hehehehe teimo em dizer que não sou teimoso.

Diego disse...

Um pouco de teimosia sempre cai bem. Admiro estes teimosos. E agora entendo um pouco melhor a origem do nobre amigo.
Tomei poucos Barolos nesta vida, mas nunca tomei algum que tenha sido menos que espetacular.
Este do tio Bartolo tá na lista. Uma hora eu teimo em gastar mais do que ganho e compro ele.
Abraços